Aproveitando as últimas aulas de penal.
Fonte: Site do IBCCrim
Entre os temas de grande repercussão social que entraram para a pauta de julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), está a interrupção terapêutica da gestação de fetos anencéfalos. Este polêmico assunto vem sendo discutido na Suprema Corte desde 2004, época em que a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde ajuizou a ADPF 54 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental).
Sob a ótica médica, a anencefalia é entendida como ausência total ou parcial de cérebro, mas é leigamente tratada como “simples” má-formação cerebral. Nesse tipo de situação, a expectativa de vida, quando existente, é sempre muito curta, variando segundo o grau da patologia.
A legislação brasileira prevê apenas duas hipóteses em que o aborto pode ser autorizado. De acordo com o artigo 128 do Código Penal, é permitido quando a gravidez for de risco para a gestante ou resultante de estupro. Partindo da leitura desse dispositivo, a prática não pode ser consentida se motivada por anencefalia, o que é bastante discutível.
Se a falta de parte ou todo cérebro do futuro bebê não é justificativa legal para admitir o aborto, a mãe fica submetida a um intenso sofrimento psicológico, posto que é obrigada a gestar uma criança que saber ter praticamente nenhuma chance de vida extra-uterina. Essa “tortura psicológica” a que a gestante é condenada estimulou a discussão do tema.
Em 2008, houve uma audiência pública que reuniu especialistas em genética, entidades religiosas, representantes do governo e da sociedade civil. Durante os quatro dias de audiência, os defensores do direito das mulheres de decidir sobre prosseguir ou não com a gravidez de bebês anencéfalos puderam apresentar seus argumentos e opiniões, assim como aqueles que acreditam ser a vida intocável, mesmo no caso de feto sem cérebro
Apesar de a anencefalia não ser amparada por lei, não são poucos os juízes que, tendo em vista a saúde psicológica da mãe, autorizam a antecipação terapêutica do parto sob o fundamento de princípios como a dignidade da pessoa humana e o direito à saúde. Há discordâncias, justificadas por colocações de ordem religiosa e moral, mas que devem ser também respeitadas.
O cerne da discussão no Supremo envolverá a descriminalização da prática nesses casos. A decisão mais sensata parece apontar para a desobrigação da mãe em cultivar uma vida sem perspectivas contra sua vontade. Desse modo, caberia a ela optar por continuar a gestação ou não, evitando sofrimento e trauma desnecessários.
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